Em 1994, Miguel Soares realizou o vídeo Copyright Law, uma sequência de centenas de imagens gravadas da televisão e de cassetes de vídeo, ilustrando visualmente a peça sonora Crosley Bendix discusses the U.S. Copyright Act (1992) dos Negativland. No final de 2002, fez chegar esse vídeo a Mark Hosler, um dos membros do colectivo, sendo imediatamente convidado pelos Negativland a realizar um vídeo a partir de um tema deles. A escolha de Miguel Soares recaiu sobre Time Zones, uma das suas faixas preferidas do álbum mais conhecido do grupo, Escape from Noise (1987). Para fazer a animação, o artista seguiu um princípio de meticulosa sincronização com aquela texturada colagem sonora, propondo uma notável interpretação da narrativa textual com o seu campo de alusões e associações semânticas — a guerra fria que opôs Estados Unidos da América e União Soviética, a instrumentalização dos meios de comunicação como arma de guerra psicológica e o uso dos computadores como meio de controlo político e ideológico. Ao longo da obra, imagem e som entretecem uma relação simbiótica, sem que nenhum deles tome a primazia sobre o outro. A animação começa como um divertido pastiche do documentário televisivo de divulgação, fornecendo dados geográficos, etnográficos e estatísticos sobre a República Autónoma de Komi (jogo de palavras com Komi, uma república autónoma da antiga União Soviética que hoje faz parte da Federação Russa, e “Commie”, termo depreciativo usado nos EUA para designar os comunistas). A partir daqui, seguimos uma conversa ao telefone entre um ouvinte radiofónico (ou telespectador, nunca sabemos ao certo) em sua casa e o apresentador de um talk show (radiofónico ou televisivo) no estúdio. A uma questão colocada pelo apresentador — “Do you know how many time zones there are in the Soviet Union?” / “Sabe quantos fusos horários há na União Soviética?” — segue-se, num constante contraponto visual e sonoro, um diálogo fragmentado e repetitivo entre os dois, em que o ouvinte, desconhecendo a resposta, fala de modo confuso sobre o poder inigualável dos EUA, a necessidade de usar os computadores para controlar os desvios e as imperfeições da população, ou a relação indissociável entre política e religião. As imagens que alternam entre o apresentador e o ouvinte são intercaladas com outras mostrando, por exemplo, bases aéreas em cujos hangares se escondem discos voadores, o lançamento de mísseis nucleares a partir de um cemitério, muros vermelhos (representando os fusos horários) a percorrerem o mapa da Rússia e a invadirem os interiores das casas, um ataque massivo à União Soviética por parte dos Estados Unidos, ou mísseis nucleares a cruzarem o território gelado da Sibéria. Esta animação foi trabalhada quase diariamente durante um ano, contando com constante feedback por parte dos Negativland, e em especial de Mark Hosler, ao longo de todo o processo. Em 2005 e 2006, foi apresentada na exposição Negativlandland, comemorativa dos 25 anos de actividade dos Negativland, e em 2007 incluída no DVD Our Favorite Things, uma compilação de dezoito vídeos realizados a partir de peças sonoras do grupo.