Será que tudo o que existe em nosso redor não passa de um mero cenário? Flores de plástico, árvores em cartão e - o pior - o perfume de ambientador de lavanda!… Em “Decorado”, Alberto Vazquez, cujo estilo pessoal enquanto ilustrador e realizador de filmes de animação é sobejamente conhecido e premiado, subverte o universo das histórias infantis numa espécie de fábula existencialista de humor corrosivo, em que as personagens são animais antropomórficos e, muitas vezes, terríficos e doentios. A personagem principal debate-se com uma angústia profunda e interroga-se sobre o facto do cenário ser demasiado bonito para a vida que leva, que não é, de todo, feliz. A sua companheira, com todo o seu pragmatismo, explica-lhe que sim, que tudo em redor não passa de um cenário mas que, pelo menos, é o deles. No entanto, a floresta onde vivem, o “decorado”, não passa de um universo a preto e branco – em contraste com o colorido habitual das fantasias infantis – feito de recortes de imagens impressas, como ilustrações algo datadas ou gravuras a água-forte típicas do séc. XIX. O conjunto das demais personagens, em alto-contraste, contribui para o surrealismo da história e para a destruição completa das fantasias de infância e do desejo de felicidade. Mas, afinal, quem se aborrecerá com a destruição desse desejo tão artificial de felicidade? (MM)