Quem visita pela primeira vez o centro da cidade de Münster, na Alemanha, atentará nas três bizarras jaulas de ferro que pendem do campanário da catedral. Originalmente, nelas foram exibidos os cadáveres de três homens, os três líderes anabatistas da cidade, depois de terem sido torturados e executados publicamente: John of Leiden, Bernhard Knipperdolling e Bernhard Krechting. As jaulas permanecem no mesmo lugar há quase 500 anos como relíquias do seu reinado. “Münster”, filme de Martin Le Chevalier – autor reconhecido no mundo das artes plásticas pelo seu olhar crítico às ideologias e mitos contemporâneos – aborda a história do nascimento e queda do Anabatismo, corrente protestante em rutura com o luteranismo, que advogava uma sociedade comunista, em pleno séc. XVI, uma experiência política completamente inédita e um contra-modelo que colocava em causa o poder político, religioso e económico estabelecido. Porém “Münster” não é uma reconstituição desse período mas um trabalho autorreflexivo, tanto na forma cinematográfica enquanto representação como no enunciado, ao qual vai replicando possíveis respostas a cada discussão, logo se questionando e abraçando novas meditações sobre a invenção dos mitos, a verdade histórica (tão ostensiva quanto oculta), ou a embriaguez da fé e do poder. (SR)