A primeira longa de Durkin vem, na sequência da curta “Mary Last Seen”, reiterar o seu interesse primordial (partilhado, de resto, pelo seu colega e amigo Antonio Campos): a América e a sua história, a sua mitologia, o seu subconsciente, a sua psique. A partir da história de Martha, uma rapariga frágil e carente de afetos familiares, que pensa encontrar-se consigo própria no interior de uma seita (ainda hoje numerosíssimas na América), Durkin questiona os valores, as ideias e as psicoses dessa sociedade tão complexa e fascinante como é a americana, a começar na família, passando pelo materialismo e o consumismo, o American dream, a violência e terminando na derradeira ideia de escape, de fuga – irónico o facto de Martha acabar, depois, a fugir da… seita – a uma sociedade “doente” através de formas alternativas de vida (amor livre, comunitarismo, autogestão, etc.). Neste último caso, em particular, Charles Manson, uma das grandes “questões” mal resolvidas do século XX americano, vem indisfarçavelmente à tona, passo no qual a cultura totalitária, violenta e, afinal, de ódio que insufla muitas destas seitas é desconstruída por Durkin. A montagem paralela, narrando a ação no presente e em flashback, mais do que criar uma estrutura visualmente sobreposta (de um plano de Martha a saltar, no presente, para um lago, passamos para um salto para outro lago no passado, num fluxo contínuo que corresponde ao seu fluxo mental), confunde, deliberadamente, o presente e o passado, memória e fantasia, realidade e paranoia. Simultaneamente, esse mesmo “paralelismo” favorece e extrema a tensão entre as duas filosofias de vida em confronto, como se tudo se jogasse naqueles dois polos opostos e não houvesse nenhuma outra opção intermédia de vida para Martha, sintoma de uma certa e real desorientação entre a população americana mais jovem (ontem como hoje). (FN)