Homens e mulheres declamam nas ruas de uma cidade (nas Filipinas, país natal de Lav Diaz?). Falam línguas diferentes – inglês, filipino (?) –, parecem furiosos e sentimentais. Uma frase ressalta: “To be or not to be...”. Shakespeare, “Hamlet”, um dos expoentas da literatura ocidental. Porque estão estes declamadores em fúria? Num dos planos, eles olham diretamente para a câmara, desafiam o espectador, que tenta fazer sentido desta cacofonia (literal). A filmagem é, por vezes, rude, apesar do belíssimo preto e branco (imagens em movimentos desordenados, cortes brutos), mostrando como se trata quase de um panfleto, quase uma forma subversiva de “publicidade” (os planos também imitam, muitas vezes, enquadramentos “perfeitos”). No final, uma chuva apocalíptica. O dia depois do fim... Já tudo acabou ou tudo pode começar? O filme de Diaz é um desafio aos sentidos e à comunicação humana: a toda a cultura que pesa sobre nós, meros corpos frágeis que assumem a indigência do mundo. O que pode restar depois disso? Este é o primeiro filme de Lav Diaz no Curtas Vila do Conde. O autor filipino é um dos mais respeitados cineastas da última década, muito conhecido pelos seus filmes longos. No último Festival de Berlim, onde recebeu o Prémio Alfred Bauer, apresentou “A Lullaby to the Sorrowful Mystery” com oito horas de duração. Como marcos da sua filmografia, mantém-se “Norte, the End of History” (2013) e “From What Is Before” (2014), tendo o último venceu mesmo o Leopardo de Ouro no Festival de Locarno. (DR)