Possuindo várias marcas das primeiras obras de Ossang – o policial, a força da destruição como ideia polarizadora, a fragmentação da montagem -, L'Affaire des Divisions Morituri é o projeto final da sua passagem pelo IDHEC. O tom é negro, de um mundo pós-apocalíptico, onde surgem gladiadores urbanos, de estética punk, que vivem numa dimensão exterior ao mundo normal. No entanto, há uma perseguição policial, vestígios de um cinema "tradicional" e também de uma prática violenta de Estado. O filme também entra no imaginário da rebeldia juvenil europeia, decorrente da morte de vários dos membros mais relevantes da RAF (Rote Armee Fraktion/Fração do Exército Vermelho, também conhecidos como Grupo Baader-Meinhof). Ossang entra, assim, num domínio político que atravessou toda a sua filmografia, criando uma estética punk, em que a narrativa serve como motor dos impulsos criativos e violentos do próprio filme. Isso é também evidente nas palavras de ordem que surgem, de forma repetida, no ecrã, mas também da música, com evidência em várias das bandas mais radicais da época: MKB Fraction Provisoire (uma das bandas do próprio Ossang), Cabaret Voltaire, Tuxedomoon, Throbbing Grisle e Lucrate Milk. A paisagem industrial dos portos é recorrente (como noutros filmes), colocando L'Affaire des Divisions Morituri numa estética suja e decadente. Por isso mesmo, a morte é uma das forças motrizes do filme, uma espécie de regeneração possível para o humano. (DR)