A música punk que acompanha as imagens iniciais de um casal, ele a fazer waterski, ela a conduzir o barco, pressagia desde logo um acidente que parece inevitável, e anuncia com estrondo que estamos numa obra de F. J. Ossang. O filme, que faz belo uso dos cenários naturais dos Açores onde foi rodado, e que conta com a participação do ator português Diogo Dória, apresenta uma trama convoluta, que funciona como espelho do estado mental da personagem principal, o infeliz acidentado da primeira sequência. Quando este acorda de um coma - na verdade, nunca fica claro se este recuperou totalmente, num piscar de olhos ao espectador que eleva a alucinação e desorientação do filme - e parte em busca da namorada, vê-se no centro de um torvelinho de personagens exóticas, perdido num limbo labiríntico, no qual em vez de encontrar becos sem saída, depara-se com portas para estranhas realidades. Na criação de um ambiente entre um sonho e um pesadelo, que traz à memória a distopia de "O Elemento do Crime" de Lars von Trier, o filme alterna entre momentos surreais de ficção científica delirante, e pequenas composições poéticas, onde se destaca a liberdade da câmara, à medida que constrói uma mitologia própria a partir da iconografia cinéfila. (JA)