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Cartaz da edição 2024

O Vermelho, ao invés de passadeiras, acaba por colorir alguns cravos.

No rescaldo de cada ano de festival, a equipa de programadores do Curtas faz uma análise cuidada dos mais variados aspetos dos quais se pode aferir o sucesso relativo de cada decisão tomada, não só através dos indicadores de bilheteira, como da recolha de opiniões, de forma direta e indireta. Com este conjunto de dados, parte em busca de novas entradas, de articulações possíveis com o seu histórico sobretudo o mais recente – e novidades absolutas entre obras e autores/as que vão surgindo no panorama global do cinema, com especial atenção aos que emergem entre nós e na Europa.


Há, no entanto, uma ideia que persiste, talvez ainda deste jogo intrincado de opções, que é a de resistência. O Curtas consolidou-se como um festival incapaz de ceder a qualquer pressão provocada por uma maré de formatação, banalização e desinformação, amplamente propagada pelos mais variados meios de comunicação, especialmente pelos canais que se baseiam no consumo imediato e sem filtros, sobre o que pode ou não ser cinema de qualidade. No ano em que se completam cinco décadas após o término da censura, a melhor forma de abordar a questão será – acreditamos – a persistência em mostrar como o cinema pode ser livre, no máximo da sua diversidade, da sua evolução enquanto linguagem, não sujeito a fórmulas estanques, agarradas a soluções de intuito estritamente comercial. A programação do Curtas mantém, por isso, a maior abertura quanto aos critérios que orientam a seleção dos filmes mais recentes, particularmente nas seções competitivas, procurando arrojo e intensidade, diversidade e pluralidade, dando espaço ao maior número possível de países participantes, a autores dos mais jovens a outros já consagrados, alcançando níveis de inclusão e igualdade de género assinaláveis.


A ideia de um festival é sempre a de uma grande festa em torno de uma área de expressão artística em especial, neste caso obviamente a do cinema, mas, mais uma vez, o Curtas dará espaço aos cruzamentos com outras áreas contíguas, como a da música e a das artes plásticas.


O Stereo alarga-se a uma versão mais abrangente, tanto em géneros musicais, como em variedade de propostas, que vão da interpretação ao vivo das músicas dos filmes, às experiências mais erráticas e reativas de som e imagens em movimento, que podem até ser geradas aleatoriamente e com auxílio da inteligência artificial.


A secção In Focus é dedicada a obras e autores que contribuíram para a criação desta mesma imagem do Curtas, de cinema e liberdade. A cumplicidade entre a dupla Bertrand Mandico e Elina Löwensohn serve como mote para um programa em que se desenvolvem duas vertentes com vários pontos de contacto. Mandico propõe um conjunto de filmes da sua autoria, muitas vezes com Elina como atriz, coadjuvado por sessões de filmes que de algum modo o influenciaram ou inspiraram e escolhidos pelo próprio. Elina é a protagonista principal de três longas-metragens de culto da década de 90, que poderemos rever, dos anos em que o Curtas nasceu. Ambos terão momentos destinados a falarem dos seus percursos, mas Mandico entrevistará Elina. Decerto se descobrirá uma nova forma de abordagem à sua história pessoal e ao seu papel de musa e atriz.


Também cineasta em foco, Alberto Vázquez, encontrará o público que tão bem o conhece – “Decorado” foi vencedor do Prémio do Público em 2016 – mas terá agora oportunidade de apresentar o pleno dos seus filmes, curtos e longos. Curiosamente, as obras dos autores em foco têm traços comuns de irreverência, iconoclastia, inconformidade e apostam, na sua maioria, em ambientes místicos e algo surreais, trabalhando o caráter simbólico das suas personagens e criaturas mágicas sobre cenários bizarros ou extravagantes e o subconsciente do espectador, levado a vaguear por esses lugares indefinidos e a conviver com os seus (deles) fantasmas.


A programação New Voices destaca a catalã Laura Ferrés e o grego Yorgos Zois, que, depois das participações na Competição Internacional do Curtas em anos anteriores, atingem, mais recentemente, uma assinalável repercussão no panorama do cinema europeu contemporâneo. Tal como Mandico, todos os demais cineastas em retrospectiva, tanto In Focus como New Voices, fazem escolhas personalizadas de filmes que contextualizam as suas obras.


Referenciadas todas estas retrospectivas de autor, há ainda que destacar a presença do artista e cineasta Morgan Quaintance, vencedor do prémio da Competição Experimental do Curtas por duas vezes, que imaginou um percurso expositivo para a Solar – Galeria de Arte Cinemática e um programa de filmes, que engloba tanto alguns da sua autoria como outros, cujas articulações se poderão esclarecer nos momentos destinados ao contacto e à partilha de experiência com o público e profissionais acreditados: uma master class e uma visita guiada.


A dimensão do cinema português é detalhada pela inclusão dos filmes nacionais na Competição Internacional, também repetidos em sessões exclusivas, e por duas sessões muito especiais: Rodrigo Areias apresenta a sua mais recente longa-metragem com música interpretada ao vivo e Diogo Costa Amarante faz uma estreia a Norte. São ambos cineastas de referência do panorama nacional e também eles contribuíram largamente para o desenvolvimento do Curtas, das suas ideias de programação e do seu atual formato. No caso das curtas portuguesas, encontrou-se um equilíbrio entre novas entradas de cineastas emergentes e alguns dos nomes cuja participação já se torna senão habitual, pelo menos reincidente.


Para além disso, há toda uma programação destinada a profissionais acreditados, o Curtas Pro, que promove as novas produções, quer em estado de projeto, procurando ainda financiamento, quer em estado de desenvolvimento ou finalização, procurando uma estreia num festival de cinema internacional. A componente formativa, o Take One!, completa esta oferta com os filmes representantes das diversas escolas do país e até de estudantes portugueses no estrangeiro. 


O futuro do festival joga-se a cada edição, assumindo um capital de risco considerável através do arrojo da sua programação, com participação direta também na construção do futuro do cinema português. Mas sem um projeto consistente de criação de novos públicos, através, por exemplo, da programação Curtinhas e My Generation, que prolongam a atividade articulada com a comunidade educativa da região e que é levada a cabo pela mesma equipa ao longo de todo o ano, não seria possível tão bem nele acreditar. Vila do Conde será, este ano, de 12 a 21 de julho, mais uma vez a cidade do cinema. Há muitos filmes para descobrir num programa repleto, tanto de obras recentes em estreia, como de referências inultrapassáveis e inéditas do cinema português, europeu e até mundial.

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